Não podemos colocar nas mãos dos outros as nossas decisões. Cabe-nos a nós definir as coordenadas da batalha naval. Eliminar os obstáculos, apagar as incertezas… pensar… agir.
Podemos até ouvi-los… pedir-lhes conselhos… reflectir. Mas será desastroso deixar nas mãos de outrem aquilo que nos compete realizar. Mais tarde ou mais cedo acabaremos envoltos de arrependimento.
Se há alguém com quem não podemos deixar de ser honesto é com a nossa alma. Aquela que habita em nós 24 horas por dia e que sabe tudo, mesmo aquilo que ousamos negar deixando a razão falar mais alto.
“Deus e o Diabo é que me guiam mais ninguém!”, cada um sentado num ombro a dar palpites. Depois de infindáveis discussões acesas, quando cá fora tudo parece calmo e aqueles dois se debatem até à exaustam de cada neurónio, há um que vence. E então, não há que ter medo de escolher um caminho, o NOSSO caminho... a isso chama-se viver!
Cântico Negro - José Régio
"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!